terça-feira, 25 de dezembro de 2007

DOM, TÁ VIVO NA TERRA E NA ETERNIDADE

Hei Dom, você tá vivo. lembra das nossas lutas e caminhadas de fé e esperança? Fé e libertação? Fé e política? Fé e opção pelos pobres? Lembras da tua visita pastoral as Comunidades Eclesiais de Base – CEBs da Fumaça, Entrada da Lua e Inferninho? Da caminhada realizada na Favela? Foi tão libertadora que as famílias ainda hoje falam da sua humildade e simplicidade, do seu sorriso dando a mão, falando com cada pessoa pobre e abençoando. Eram pessoas que naquela época não conseguiam falar nem com o Vigário e ali conversavam com o Cardeal quase Papa. Quanta felicidade você trazia para aquelas famílias migrantes da seca, faminta de sonhos e esperança da qual você alimentava como pastor e profeta da Teologia da Libertação, resgatando o Cristo que veio em vida para nos libertar.
Dom, lembras as reuniões da Forania, dos confrontos acirrados entre leigos e padres que não aceitavam a orientação libertadora da Igreja, onde tinha padres que trazia seus discípulos pra nos chamar de comunistas e você ficava parecendo um arco-íris mudando de cor e falava sempre com muita firmeza em defesa da Igreja do Cristo Libertador, do Cristo que não dá o peixe, mas que ensina as pessoas a pescar.
Essas mesmas cenas se repetiam nas Assembléias Arquidiocesana de Fortaleza, na década de 80, onde camponeses/as, trabalhadores/as rurais e desempregados/as se encontravam na mesma fé cristã aprendida nas Comunidades Eclesiais de Base – CEBs, muitas vezes perseguidas pelos vigários e fortalecidas na palavra e força do Arcebispo Aloísio Lorscheider. Assembléias que não se conseguia o consenso, nem com a franqueza da sua palavra, era uma luta de poder disputada na votação.
Como era bom aqueles momentos acirrados entre a Igreja conservadora e a Igreja libertadora, lá todos estavam juntos no mesmo palanque, com o mesmo direito de voz e voto, ali, estávamos exercitando a democracia, a participação, a disputa de poder. Como aprendemos nessa escola da vida, administrada por você, sem o uso da hierarquia, buscando sempre o convencimento, a compreensão, o entendimento sobre os ideais cristãos libertadores.
Ainda era tempo de Ditadura Militar e não conhecíamos os instrumentos democráticos de participação e foi você que nos proporcionou esse espaço, abrindo as portas da Diocese para a participação dos pobres. Foi assim, no apoio a luta por reforma agrária e urbana defendendo as ocupações de terra, vendo a propriedade privada, não como direito, mas como uma hipoteca social. Foi assim, durante cinco anos de seca (1979 a 1984) quando os camponeses ocuparam Fortaleza em busca de alimento, moradia e trabalho, quando organizou-se a Jornada de Luta de Contra a Fome, quando foi necessário acampar em frente ao Cambeba e fazer greve de fome diante da intransigência do Governador Tasso Jereissat, reprimindo o movimento organizado com polícia, em vez de atender suas necessidades.
Dom, foi você que me fez deixar de ser ateu, encontrei na sua espiritualidade e nas suas ações, o Deus que acolhe, que liberta, que é amigo, o Deus do amor, da justiça e da fraternidade. Um dia conversamos sobre isso, eu, você e a Lúcia minha companheira, quando vínhamos juntos no carro de Pacajus a Fortaleza, pegamos uma carona e você era quem dirigia. São essas coisas que lhe torna imortal e eterno no céu e na terra. Que me permite essa intimidade de conversarmos de eu pra você. De saber que estais reunido com os companheiros e companheiras da mesma caminhada que seguiram antes pra eternidade.
Hoje é Natal de 2007, Deus esteja conosco. Amém, aleluia, axé.

Leonardo Sampaio
Educador Popular
25/12/2007

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