segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Canalizar riachos não é o mesmo que urbanizar.


Li uma matéria do Jornal O POVO do dia 08/09/2013 intitulada “Parque Rachel de Queiroz ainda deve sair do papel em 2013”. Isto que o lado Oeste da cidade de Fortaleza precisa, almeja e luta pra que aconteça. A cobrança ininterrupta pela criação deste parque teve início em 1983, quando ainda não havia tantas intervenções de obras às margens dos riachos, em uma região de muito capim e Sítios que servia para descanso e criação de animais, inclusive com várias vacarias (algumas existentes até hoje), o que tornava o ambiente uma mistura de rural com urbano. Eu mesmo que tinha chegado do interior do Cariri ainda adolescente, sentia-me um tanto confortável em andar por dentro dos sítios curtindo a flora e a fauna existentes. Neste caso, com a permissão dos caseiros.
Já a história do Parque, começa com o loteamento do Sítio Pici, no inicio da década de 1980, quando os lotes estavam sendo vendidos e o corretor passou a morar na Casa Grande, foi aí que, conversando com as pessoas mais antigas do bairro, encontrei as lavadeiras de roupas, as engomadeiras, as faxineiras, os Senhores que arriavam os animais na charrete para Rachel passear e conversei também com as Senhoras que na época eram crianças e brincavam com a jovem escritora. Foi assim que descobri que Rachel de Queiroz havia morado ali, onde escreveu seu primeiro livro, O Quinze. A partir dessa descoberta, as CEBs da Fumaça (Comunidade Eclesial de Base da Igreja Católica), passaram a refletir a importância histórica do local e apresentamos para as autoridades a proposta de criar o Pólo Cultural Rachel de Queiroz, aproveitando os espaços verdes no entorno da casa, como o açude e as cacimbinhas nas margens do Riacho Cachoeirinha onde as mulheres lavavam roupas e as crianças brincavam nas águas cristalinas e pescavam piabas para o alimento etc.
Enquanto essa história de urbanização do Riacho Cachoeirinha estava no Henrique Jorge, Jóquei Clube e Pici, o mesmo acontecia com o Riacho Alagadiço nos Bairros São Gerardo, Ellery e Presidente Kennedy, sendo que os dois se encontram no Antônio Bezerra. Foi a partir desse diálogo dos dois movimentos ambientalistas do Oeste de Fortaleza que foi elaborado pela prefeitura o Projeto “Parque Rachel de Queiroz”, em 1995. Ao surgir o Projeto, os dois movimentos sentiram a necessidade de unificar a luta, criando o “Movimento Pró-Parque Rachel de Queiroz”, que compreende a urbanização com preservação natural do leito do Riacho Cachoeirinha, partindo do Açude do Sítio Pici, no Henrique Jorge e o Riacho Alagadiço, iniciando no Açude João Lopes, no Bairro Ellery.
Sobre a matéria do Jornal, o Movimento discorda do projeto de canalização que está em curso. O projeto Drenurb foi iniciado na gestão da ex-prefeita Luizianne Lins e está dando continuidade com prefeito Roberto Claudio. Desde o inicio das obras o Movimento lançou protesto e cobrou a execução do projeto original, elaborado ainda na gestão de Juraci Magalhães, que preserva a fauna, a flora, o leito e criaria espaços de lazer para a população. O Drenurb está canalizando sim, cimentando as margens e construindo uma manta de cimento com concreto no solo do leito dos Riachos, e entendemos que isto é a mesma coisa que criar esgoto. O Movimento compreende que essa é a forma de descaracterizar os Riachos para beneficiar a especulação imobiliária nas proximidades, já que às margens do Riacho deve sempre existir uma área de preservação permanente de até 15 metros de cada lado e mais a área de proteção ambiental, onde não podem ser construídas edificações residenciais etc. Esse espaço de proteção é aonde o poder público deve construir os equipamentos de lazer, de socialização, esportivos, educativos etc. Já com a obra que está em andamento da forma como o Drenurb está fazendo em estilo de Canal, reduz a área de preservação para apenas 5 metros e acaba com o espaço de proteção, o que vem beneficiar as construtoras, permitindo que as mesmas façam aterros e diminuam as áreas verdes e a qualidade de vida no Oeste de Fortaleza.
Podemos ver então que não há nesse projeto nenhum interesse urbanístico com a cidade e com a melhoria de vida das pessoas, mas sim, proteger o capital especulativo imobiliário do mercado capitalista e consumista.

Leonardo Sampaio
Educador, Historiador Popular, membro do ESCUTA (Espaço Cultural Frei Tito de Alencar) e do Movimento Pró-Parque Rachel de Queiroz.